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Glossário: Deuses egípcios

Sob forma antropomórfica, zoomórfica e antropozoomórfica, os antigos egípcios tinham um vasto panteão de mais de 2000 deidades. Segundo a crença egípcia, a sua carne era feita de ouro puro, os seus ossos de prata e os seus cabelos de lápiz-lazuli.

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Estátuas da deusa Sekhmet no Musée du Louvre (Sala 324, Ala Sully, Nível 0)| Cláudia Barros 

 
Uma das caraterísticas mais relevantes dos deuses egípcios era o seu aspeto. Uns eram apresentados de forma antropomórfica (humana), outros forma zoomórfica (animal) e os restantes a forma antropozoomórfica (mistura entre o humano e o animal). Segundo a crença egípcia, a sua carne era feita de puro ouro, os seus ossos eram de prata e os seus cabelos de lápiz-lazuli.
 
Maior parte destes deuses assumiu, inicialmente, um caráter local, ou seja, cada cidade/nomo tinha o seu deus patrono – quem os protegeria e a quem os seus habitantes deviam culto. Porém, já em fases posteriores e também graças ao desenvolvimento político, algumas divindades ganham importância e começam a ser cultuadas um pouco por todo o país.
 
Convém ter em atenção que, apesar do aspeto humano de alguns, um deus é apenas um conceito, uma ideia, uma formulação mental dos antigos egípcios.
 
Aqueles de que mais ouvimos falar são Osíris, Ísis, Anúbis, Hórus, Rá, Amon, Thot, etc. Contudo, os egípcios possuíam mais de 2000 deidades… Um número bem grande para decorar, não?

Painel explicativo sobre os deuses egípcios, exposto numa das vitrines do Musée du Louvre | Cláudia Barros

Glossário
Aton: deidade egípcia representada sob a forma de disco solar, do qual pendem vários braços que terminam em mãos, as quais portam ankhs. O seu culto foi promovido durante o reinado de Akhenaton, suscitando conflitos com os sacerdotes de Amón e a população egípcia.
 
Amón: deus antropomorfo de pele negra/azulada, representado sob a forma de um carneiro adornado com uma tiara, da qual saem duas penas de falcão divididas em sete secções, o que justifica que poderia ser um deus relacionado com o céu. O seu toucado pode, por vezes, comportar um disco solar e normalmente encontramo-lo representado sob a forma de uma múmia, como sucede com outros deuses criadores (Castel, 2001).
 
Maahes: deus da guerra. Representado como um homem com cabeça de leão com a coroa atef ou um tocado com um uraeus e um disco solar. Em Bubastis era considerado filho de Rá e Bastet. Por sua vez em Mênfis e em Taremu estava associado com Nefertum e considerado filho de Sekhmet e Ptah. 
 
Atum: o mais antigo dos deuses, aquele que se criou a si mesmo, o criador dos deuses. É a cabeça da Eneada Helipolitana. Personificação do sol do Mundo subterrâneo. É representado sob forma humana com uma coroa dupla. Na sua forma animal podemos encontrá-lo como um leão, um touro, um babuíno, um anfíbio, um mangusto que luta contra serpentes. No período tardio é representado como uma enguia, uma lagartixa, um gato ou uma serpente com cabeça de leão (Castel, 2001).
 
Khonsu: deusa da Lua. Filho de Amon-Rá e de Mut, é o terceiro membro da Tríade Tebana. Poderes curativos. Representado sob a forma de um homem mumiforme com barba, coroado por uma lua crescente e um disco solar, com um uraeus e uma trança lateral (símbolo da juventude), porta nas mãos um ceptro uas, um djed, um ankh, um cajado, um mangual. Também pode aparecer com corpo humano e cabeça de falcão ou de babuíno, coroado com a lua crescente e o disco solar.
 
Anúbis: um dos primeiros deuses do Submundo, relacionado com a mumificação, representado sob a forma de um homem com cabeça de chacal ou simplesmente como um canídeo de pele escura. É ele quem leva os defuntos perante o Tribunal de Osíris.
 
Bennu: divindade solar, representada sob a forma de uma garça. Associada à inundação do Nilo, à morte e ao renascimento. Com o mesmo valor simbólico que a fénix grega. 
 
Montu: deus solar, mais tarde associado à guerra. Representado com cabeça de falcão ou de touro, coroado com o disco solar, duas plumas e dois uraeus. Podemos ainda vê-lo armado com um arco e um machado. Muito popular na zona de Tebas, era o deus patrono de Hermontis. 
 
Akker: personificação do horizonte e da superfície fértil da Terra, era o guardião do Este e do Oeste. Divindade associada ao submundo, uma vez que é o guardião das portas da Duat, ganhando o epíteto 0 «Guardião dos secredos que estão na Duat». É ele que abre as portas entre a Terra e a Duat para que a barca de Rá passe. Começa a ser cultuado na I Dinastia (c. 3050-2813 a.C.) com Hórus Aha e Hórus Djer; e na III Dinastia aparece nos Textos das Pirâmides do faraó Hórus Khaba / Teti. Representado como um pedaço de terra com um disco solar no centro e dois leões em ambos os extremos. Pode aparecer também como uma franja de terra com cabeça humana e dois braços de cada lado. 
 
Thot: deus do conhecimento e da sabedoria. Representado sob a forma de um íbis ou de um babuíno, pode também aparecer com cabeça de íbis e corpo humano com uma paleta de escriba e uma pena na mão. É considerado o inventor da escrita e o escriba e mensageiro dos deuses. Associado aos deus Hermes pelos gregos. 
 
Anuket: filha de Satis e Khnum, deusa das cataratas da zona de Assuão. Também é mencionada nas fontes como sendo filha de Rá.
 
Neper (ou Nepri): deus do grão associado às colheitas. Representado com através de uma figura composta por de grãos de trigo, ou sob forma humana com espigas nas mãos ou na cabeça. Também o podemos ver como uma criança a ser amamentado pela deusa Renetutet, sua mãe. Venerado na zona do Faium. 
 
Renetutet (ou Hermutis): deusa da alimentação, da fertilidade e das colheitas. Guardiã do faraó. Representada sob a forma de uma serpente ou como uma mulher com cabeça de serpente, portanto uma coroa com duas plumas, um ureus ou um disco solar entre dois cornos. Originalmente foi concebida como uma divindade celeste. Mãe de Neper e esposa de Sobek. Outras tradição considera-a como mãe Nehebkau e esposa de Geb. Surge na Letania de Rá como a «Senhora das Justificações».
 
Bes: protetor da casa real e do deus solar. Deidade tutelar do matrimónio. Génio protetor que aparece durante o Império Novo, de aparência humana, com um aspeto grotesco, barbudo e com uma cabeleira ou uma coroa de penas na cabeça, mostrando a língua. Pode aparecer representado nu ou apenas com uma pele de leão a cobrir-lhe o corpo como capa. Nas mãos costuma portar uma faca, instrumentos musicais ou o símbolo de proteção Sa. Quando representado sob a forma animal aparece como um macaco ou um leão (Castel, 2001). Possivelmente será originário da terra de Punt ou da Núbia.
 
Ammit: deusa híbrida com cabeça de crocodilo, metade leão-hipopótamo. Conhecida como a “Devoradora dos Mortos” e encontra-se mesmo ao lado da balança onde é pesado o coração do defunto, durante o Julgamento de Osíris. Caso o coração do humano julgado fosse considerado como impuro, este seria devorado pela deusa e o defunto perdería a sua condição imortal.
 
Duamutef: um dos “Quatro Filhos de Hórus”, de aspeto humano mumiforme com cabeça de chacal. Por vezes, pode assumir a forma de um pássaro (Castel, 2001). Protege as vísceras dos defuntos, delegado do Este e guardião do estômago.
 
Ra: deus do sol, o primeiro a ser criado por Atum a partir das águas celestes (Nun). A sua vitória sobre Apep preserva o equilíbrio cósmico e garante a continuidade da vida. 
 
Apep: a grande inimiga de Rá, geralmente representada sob a forma de uma serpente gigante. Simboliza a escuridão, nuvens ou qualquer forma que obstrua a luz do Sol. De acordo com a mitologia egípcia, todas as noites luta contra Rá durante a sua viagem ao longo da Duat (Submundo).
 
Min: divindade masculina da fertilidade, representado sob a forma humana com um falo ereto e o braço direito a segurar um mangual. O deserto está dentro da sua jurisdição. 
 
Khepri: deus bastante antigo associado à criação do Mundo, representado sob a forma de um escaravelho.
 
Ptah: ‘o Senhor da Vida’, um dos grandes deuses de Mênfis, que de acordo com a cosmogonia menfita era identificado como criador do Mundo. Deu vida ao Mundo através do pensamento e da fala. O seu nome significa «O que abre» e acredita-se que foi ele quem elaborou o ritual da «Abertura da Boca». Aparece sempre representado sob forma humana.
 
Amentit: deusa da necrópole tebana que personifica uma das formas de Hathor e, como tal, protege os defuntos (Castel, 2001: 14).
 
Harmaquis: ‘Hórus que está no horizonte’, o nome dado à Esfinge de Gizé. Deus masculino, representado como um homem com cabeça de falcão ou de leão, ou como um carneiro com cabeça de leão, esfinge ou falcão.
 
Shu: representa a luz; aquele que levantou o céu (Nut) e o separou da terra (Geb/Keb). Representado sob a forma de um homem com uma ou várias plumas na cabeça, juntamente com um ceptro na mão.
 
Geb (ou Keb): deus da terra, filho de Shu, esposo de Nut, pai de Osíris, Ísis, Seth e Neftis. De aparência humana com o pénis erecto. Porta na cabeça a coroa branca (atef), ou a coroa dupla (Época Baixa); e esporadicamente é representado com a coroa do Baixo Egipto (Castel, 2001).
 
Hapi: um dos “Quatro Filhos de Hórus”, de aparência humana e mumiforme com cabeça de babuíno. Protege as vísceras dos defuntos, delegado do Norte e guardião dos pulmões.
 
Hapy (Nilo): deus masculino, barrigudo, andrógeno, de pele esverdeada (símbolo de fecundidade) com cabeça humana e seios a pender, apresenta-se de pé ou em atitude de marcha (no caso das figuras de fecundidade). Sobre a cabeça ou nas mãos pode levar o lótus e o papiro. Na forma animal encarna um ganso.
 
Hathor: deusa do Ocidente, do amor, da beleza e da felicidade. Representada como uma mulher com um disco na cabeça, ou com cabeça de vaca e cornos, e o disco solar entre estes.
 
Anhur (ou Inheret, Onúris): deus estrangeiro da caça, cujo reino estava algures no deserto longínquo. Na Época Arcaica/ Tinita ((3050 – 2663 a.C.) começa a ser adorado como deus da guerra. Durante a XI Dinastia começa a ser cultuado em Abidos e Tinis. É representado sob a forma de um homem com barba, uma peruca curta e um toucado com plumas, envergando uma túnica ou uma saia. Marido de Menhit. Por vezes pode aparecer sob a forma de um leão, símbolo do poder e força.
 
Menhit: deusa estrangeira associada à guerra, como o marido Onúris, o qual a trouxe da Núbia. Associada à deusa Sekhmet, avançava à frente do exército e despedaçava os inimigos flechas de fogo.
 
Bastet: Gata ou mulher com cabeça de gata que leva na mão um sistro. Na sua forma antropomorfa possui um toucado, um brinco na orelha e um grande colar no peito. Relacionada com a proteção do defunto no Submundo. Símbolo da doçura maternal, mas transforma-se em assassina quando tem de defender um dos seus filhos. Associada ao amor, à beleza e à música.
 
Ísis: mulher e irmã de Osíris, mãe de Hórus, representada como uma mulher com um pequeno trono na cabeça ou cornos de vaca e um disco solar entre estes (Império Novo). Na sua representação animal assume a forma de uma vaca. Personifica a maga, a fidelidade conjugal e a Grande-Mãe, com uma imagem bastante mais humana que as outras deusas (Castel, 2001). Venerada na meseta de Guizé (XXI Dinastia até à Época Ptolemaica).
 
Khnum: deus muito antigo (muito possivelmente do Período Pré-dinástico), representado sob a forma de um homem com cabeça de carneiro e cornos ondulados, onde pode portar uma Dupla Coroa ou um jarro de água (Castel, 2001). Relacionado com água, vigia as fontes do Nilo, supervisionando a subida das águas do rio. Deus ligado à criação, foi ele que que dá origem ao ovo de onde nasceu Rá.
 
Hórus: filho de Osíris e Ísis, representado como um falcão ou sob forma humana com cabeça de falcão (III Dinastia). Aparece com a Coroa Dupla (atef) ou a Coroa Branca (hemhem). Deus com quem o faraó se identifica (desde o Império Antigo). Representa o Norte do país e personifica a franja fértil das terras do vale do Nilo. Partilha com Seth a defesa da barca de Rá, contra a serpente Apofis.
 
Mut: considerada como a esposa de Amon, Mut aparece na iconografia como uma mulher com um toucado em forma de abutre ou como uma mulher com cabeça de leão. Deusa da maternidade.
 
Neftis: filha do deus do céu, Nut, e do deus da Terra, Geb, irmã de Ísis, Osíris e Seth. Esposa de Seth. 
 
Nut: deusa do céu, mãe de Ísis, Osíris, Seth e Néftis. Símbolo da esfera celeste. Representada sob a forma de uma mulher com o corpo arqueado. 
 
Osíris: filho do deus do céu, Nut, e do deus da Terra, Geb, irmão de Ísis, Néftis e Seth. Marido de Ísis e pai de Hórus. Enquanto soberano da Duat (Submundo), é o protetor e guia dos mortos. Aparece representado com um cajado e um mangual e a coroa atef na cabeça – símbolos da realeza. Pode também ser representado com pele esverdeada, uma vez que é o deus da vegetação e da fertilidade. 
 
Seker: uma das formas do Sol noturno, como Ptah, Osíris e Tanen.
 
Nefertum:deus dos perfumes e do nascimento, está associado ao lótus azul, é considerado filho de Ptah e Sekhmet. É representado a emergir de dentro do lótus egípcio ou como um homem com o lótus na cabeça sob a forma de toucado.
 
Sekhmet: deusa da guerra, e uma das formas da deusa Hathor. Filha de Rá. O seu nome significa «poderosa». Representada sob a forma de uma leoa ou com corpo humano e cabeça de leoa. Juntamente com o marido, Ptah, e filho, Nefertumm, fazia parte da tríade de Mênfis. Por sua vez, em Tebas era casada com Amon, fundindo-se com a deusa Mut.
 
Maat: deusa que representa a justiça, a verdade e a harmonia do Universo. É representada por uma pena de avestruz ou como uma mulher sentada com a mesma pena na cabeça.
 
Seth: filho de Geb e Nut, irmão e assassino de Osíris. Irmão de Ísis e Néftis, também sua esposa. Deus do deserto e do caos. Símbolo do incerto, do desiquilíbrio e da maldade. 
 
Neith: deusa da caça e da guerra. Protetora das tecedeiras. Em alguns mitos surge como mãe de Sobek.
 
Sobek: deus da fertilidade e da água, conhecemo-lo como um crocodilo ou como um homem com cabeça de crocodilo. Cultuado no Faium e em Kom Ombo.

Bibliografia

Budge, W. (2023). O Livro dos Mortos do Antigo Egito. (F. Aguiar, Trad.) Barcarena: Marcador Editora.

Castel, E. (2001). Gran Diccionario de la Mitología Egipcia. Madrid: Editorial Aldebarán.

Hart, G. (2005). The Routledge Dictionary of Egyptian Gods and Goddesses. Oxon: Routledge.

Ikram, S. (2021). Ancient Egypt. An Introduction. (I. A. Blanco, Trad.) Córdoba: Almuzara.

Ikram, S. (2022). Muerte y enterramiento en el Antiguo Egipto. (I. A. Blanco, Trad.) Córdoba: Almuzara, Colección Nun.

Ryan, D. P. (2016). O Antigo Egipto por cinco deben ao dia. Lisboa: Bizâncio.

Torres, I. (2022). Como é que a Esfinge perdeu o nariz? E outras curiosidades sobre o Antigo Egipto. Lisboa: Planeta de Livros.

Wilkinson, R. H. (2003). The Complete Gods and Goddesses of Ancient Egypt. Nueva York: Thames & Hudson.

Notas

Com o passar do tempo, esta lista sofrerá as devidas atualizações.

Cláudia Barros é licenciada em Arqueologia pela Universidade do Minho (2018). Em 2022 concluiu o Mestrado, na mesma área e instituição, com a dissertação “O Olhar de Gomes Eanes de Zurara sobre o Norte de Marrocos: estudo da paisagem de Alcácer Ceguer (Ksar Sghir)”.

Atualmente é colaboradora das revistas Egiptología 2.0 (Barcelona) e El Aldabón – Gaceta Interna del Museo Nacional de las Culturas del Mundo (México), e tradutora da Ancient History Encyclopedia, especialmente no âmbito da Assirologia e Egiptologia, a sua área de estudo e eleição.

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